segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Um Conto de Natal

O Menino fugia, dos «invasores»...

Há dias, tive um sonho bastante esquisito:

Aproveitava este solzinho de inverno, que tão bem sabe, especialmente quando o frio se faz sentir mais agreste, para fazer uma caminhada – coisa que gosto imenso de praticar. Levava comigo um destino, que do sonho me não ficou memória, mas nem por isso tinha escolhido o caminho mais perto para chegar até ele. Assim, dei umas tantas voltas por este nosso burgo. De facto, é a pé que prestamos mais atenção ao que nos rodeia: apreciamos a Natureza, cruzamos com pessoas amigas, e, às vezes, pomos em dia as nossas tagarelices.

O sonho parecia mesmo realidade... E assim fui reparando que, em quase todas os edifícios, havia uns macaquinhos à «benfica» empoleirados nos beirais das janelas, subindo, ou descendo, pelas grades das varandas, ou, até, rodeando as chaminés das casas. Fiquei perplexo. Tive mesmo a sensação de que tudo aquilo materializava uma invasão... Uma praga de alienígenas clonáveis a infestar o país, ou qualquer virose deixada por cá por tantos estrangeiros que aqui tinham vindo recentemente, da Europa e da África, a debater, mais uma vez, assuntos desde sempre debatidos e que nunca chegam a lado nenhum, apesar das cimeiras realizadas – que, ao menos, sempre constituem motivo para umas jantaradas e fotografias de família... (Repito que o sonho parecia realidade...)

Eis senão quando, deparo com uma criancinha, nuinha, a gatinhar, furtivamente, ao dobrar de uma esquina. Compadeci-me do menino, e debrucei-me em jeito de nele pegar ao colo. O menino, de tenra idade, estava aterrorizado de medo. Já falava... E muito baixinho, disse-me:

- Esconde-me! Não me leves de novo para o meu lugar, que eles querem matar-me.

E eu perguntei:

- Mas eles, quem?

Quase sussurrando, retorquiu:

- Esses bonecos de vermelho com um saco às costas.

- E quem são eles – questionei eu.

- Os «paisnatais» - respondeu a criança, com o dedo no nariz, como que a

pedir silêncio.

- E donde vieram? – indaguei.

- Do frio! Eles vieram do frio, lá do Norte...

Então, quis eu saber:

- E tu, onde estavas? Quem és?

- Eu estava num presépio, desses das montras... Sou o Menino Jesus.

Ora, no meu sonho, tinha eu passado ao longo da rua, e, na verdade, verificara com agrado que em várias montras das lojas dos Carvalhos havia um presépio montado, alguns, mesmo, muito giros. Mas não reparara se todos tinham o Menino nas palhinhas, ou se algum faltava...

O sonho afigurava-se-me de tal realidade, que eu não via naquele menino um «boneco», mas sim um menino de carne e osso. Seria uma visão? Começava a ficar com a minha cabeça já um pouco encortiçada... Até que perguntei:

- Mas escondo-te onde? Onde queres que te acolha, para não seres morto pelos «paisnatais»?...

A criança, já mais contente e confiante, posta assim face à minha abertura... respondeu prontamente:

- No teu coração. Acolhe-me no teu coração, se o tens ainda bem quentinho... Se ainda não o deixaste enregelar por esses «vermelhuços» que me querem expulsar do coração dos homens, e, o que é mais grave, do coração das crianças... como Eu!

Quando ia a pegar no miúdo, para o meter dentro do meu peito... acordei. E fiquei sem saber se tinha, realmente, acolhido... o «Menino Jesus», fugido de um presépio, com medo da invasão dos «paisnatais...

Já bem desperto, veio-me prontamente à memória as palavras de Cristo, no Evangelho:

«Quem não receber o reino de Deus como uma criancinha, não entrará nele» (Mc 10, 16).

E meditei:

Na verdade, o menino do sonho, encontrado, fugidio e aterrorizado, ao dobrar de uma esquina, tinha razão... Essa febre de «paisnatais» assaltantes que por aí anda está a matar... os «Meninos» dos presépios.

E sem estes... nunca haverá Natal!

V. S.

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