quinta-feira, 19 de maio de 2011

Os "abutres"

“Compramos a dinheiro ouro, prata, jóias... cautelas de penhor...” etc.

Nunca se viu tanta “OPA” (oferta pública de aquisição).

Os juros da dívida pública, em máximos históricos.

O desemprego atinge fasquias de recordes sucessivos.

O F.M.I., e os outros da “Troika”, aqui se instalam para injectar poder de compra e de despesa pública, através de bombas de “oxigénio” monetário, nos Bancos e no Tesouro estatal.

Depois de termos vivido vários anos no esbanjamento público e privado, à custa dos dinheiros que vinham da Alemanha e de outros países da União Europeia, agora ficámos “à rasca” porque nos apresentaram a factura... E que factura!...

Pobre povo, que afinal somos, e nunca aprendemos com os ensinamentos da História!

Mas já se vislumbra por aí uma tendência de regressar ao passado, corrigindo determinadas opções de comportamento politico e económico... Para a “governança”, defende-se uma “união” partidária, embora negando o espectro ameaçador do partido único do antigo regime (se no assento etéreo onde subiu, memória desta via se consente... o “homem da manta e das botas” deve estar a rir-se... e a dizer: “hão-de me dar razão”...); para a subsistência da grei, já se promove o regresso aos campos e ao mar, a fim de incrementar a agricultura e as pescas; em complemento, para minimizar as importações e equilibrar a balança comercial, advoga-se que se dê preferência, no consumo, aos produtos nacionais.

É claro que para uma verdadeira recuperação do Pais, mister se torna que haja um Governo forte, sensato, competente, honesto, com visão estratégica para definir os verdadeiros objectivos nacionais. E a pergunta, já que estamos à porta de eleições (mais umas!...) é: virão resolver o problema?

E qual é o problema deste Povo, do qual os Romanos já diziam, no tempo ido dos Lusitanos, que não nos governávamos nem nos deixávamos governar?!...

Estamos, caríssimos leitores, numa encruzilhada histórica. Outras já ficaram para trás! E as encruzilhadas históricas, por fatalidade, têm sido resolvidas com mais ou menos violência. O nosso mal, é que, por comodismo e exagerada ingenuidade, vamos deixando as dificuldades avolumarem-se até ao ponto de rotura... Temos o costume de esperar que as coisas se resolvam por si, e esticamos de mais a corda, até que se parte ela, e nos escaqueiramos todos por terra. Assim foi na transição da Monarquia para a República; na regeneração desta; no 28 de Maio; no 25 de Abril; no 25 de Novembro (para retro perspectivar apenas os anos mais recentes). É do senso comum, e já foi publicamente declarado por um conceituado analista, que, se não pertencêssemos hoje à União Europeia, já há muito que tinha havido um golpe de Estado em Portugal.

A nossa “doença” reside no sistema politico que temos e “nos políticos” que temos dentro desse sistema. Chamam ao sistema, “Democrático”; mas a Democracia, para o ser, tem de ser uma emanação significativa da vontade do povo, materializada em escolhas lúcidas, conscientes e responsáveis. Ora, o que hoje temos de significativo, é que o povo se alheia dessas escolhas – porque não tem muito por onde escolher, e não se revê, em termos de confiança, nas pessoas que lhe são apresentadas ao escrutínio. Assim, optam pela Abstenção. Nesta ordem de ideias, o eleitorado – que vai às urnas – não escolhe os cidadãos mais aptos para governar, mas vota na “camisola” da sua preferência “clubista”, motivada geralmente pela euforia demagógica da propaganda.

Repetimos: estamos numa encruzilhada histórica! Que nos vão trazer de novo as próximas eleições legislativas? Em quê, e em quem poderá, politicamente, residir a nossa já tão fraca esperança, para que os destinos de Portugal possam ser retomados com segurança e eficácia?!...

Os abutres andam por aí! São um triste sinal deste nosso tempo. Quando a carne do animal defunto começa a cheirar, putrefacta, eles surgem por todo o lado, enxameiam as redondezas... Pobre do nosso povo pobre!

A Independência de Portugal

“...Os homens da troika, em três semanas apenas, realizaram o que os ineptos que nos governam não tinham conseguido levar a cabo em vários anos: pôr de pé um programa para fazer face a um descalabro”. J. Cantiga. Esteves, ref. por V. G. Moura – DN 15Mai2011

Nos bancos da Escola, aprendemos que o condado Portucalense se tornou um país independente – Portugal - pela determinação de Afonso Henriques, que, após a vitória em Ourique contra os Mouros, em 1139, se afirma rei do Portugal nascente. Porém este estatuto apenas é reconhecido pelo rei de Leão e Castela a 5 de Outubro de 1143, através do tratado de Zamora, e confirmado pelo papa Alexandre III, em 1179, com a Bula “Manifestis Probatum”.

A independência de Portugal foi seriamente ameaçada mais tarde, no séc. XIV, com o interregno que se seguiu à morte de D. Fernando. Proclamado, D. João I de Portugal, pelas Cortes de Coimbra, teve o novo rei de enfrentar a oposição do seu homónimo de Castela, que resolveu invadir o nosso território. Nomeado Condestável do Reino, Nuno Álvares Pereira, hoje santo venerado nos altares, enfrentou o invasor, e venceu-o, definitivamente, na batalha de Aljubarrota. Aí está o Mosteiro de Santa Maria da Vitória para assinalar o feito, em paralelo com a lenda da padeira.

Depois de um período de expansão através dos oceanos, sob o impulso do Infante de Sagres, que conduziu Portugal à descoberta de novas terras e de novas gentes pelos cinco continentes do Mundo, e à formação de um Império, Portugal sofreu o desastre de Alcácer-Quibir, com a morte de D. Sebastião, que não deixou descendência.

Esta nova crise originou a união pessoal Ibérica, de 1580 a 1640, em que os reis de Espanha eram ao mesmo tempo reis de Portugal (a dinastia Filipina) – a nossa Independência ficou, deste modo hipotecada à monarquia espanhola. Mas não foi desta vez, ainda, o fim.

Com a revolta do “1º. de Dezembro de 1640”, das quatro dezenas de “Conjurados”, a prisão da espanhola Duquesa de Mântua (vice-Rei) e a morte do renegado Miguel de Vasconcelos (Secretário de Estado), é restaurada a Independência e levado ao trono lusitano D. João, Duque de Bragança. E uma nova era se inicia. Nos meus tempos de escola primária, ainda se cantava o Hino da Restauração, para relembrar o feito, mas isso foi-se da memória das nossas gentes, para no seu toutiço encaixar a “Grândola” e os acordes da “Internacional” (de resto, também melodias bonitas...).

Quase dois séculos depois, vieram as Invasões napoleónicas, e a Independência esteve outra vez por um fio... Salvou-se, porque a Corte foi para o Brasil, e três arremetidas das tropas francesas não foram suficientes para derrubar a nossa Liberdade (o Povo resistiu heroicamente, com ajuda dos nossos aliados Ingleses). Mas, pouco depois, foi-se o Brasil atrás do “grito do Ipiranga” (1822), e Portugal começou a recuar nos anseios imperiais que tinham dado novos mundos ao Mundo.

No princípio do século XX, o País estava cansado e depauperado, terreno de cultura para lutas intestinas de poder e de novas ideias politicas... A Monarquia caiu (1910). Não resistiu a um prévio, vergonhoso e criminoso Regicídio (1908). Instaurou-se a República, e com ela a prepotência anárquica, o descalabro governativo... Mas a Independência manteve-se, não sem o sacrifício de muitas vidas tombadas nos campos de batalha da Flandres e da França, numa Guerra mundial sangrenta (1914 a 1918), que devastou a Europa e nos martirizou em África.

Em 28 de Maio de 1926, um prestigiado general (Gomes da Costa) combatente em França encabeça uma nova revolução, e parte de Braga para Lisboa. Desfila, vitorioso, na Av. da Liberdade a 6 de Junho, à frente de 15 mil homens, provenientes de várias cidades do País, e é aclamado pelo povo da capital. Este movimento, após alguns incidentes políticos de percurso, dá origem ao Estado Novo de Salazar, que vai resistir, com alguma artimanha de politica internacional, a uma segunda Guerra mundial, a que Portugal se poupou, em termos bélicos.

Os chamados “Ventos da História” da libertação das colónias europeias fustigaram também o Ultramar português, e de novo Portugal se viu envolvido (1961 a 1974) em operações militares por esse mundo fora, sobretudo na Índia e na África, em defesa dos seus territórios e das suas gentes.

Após a morte de Salazar, o regime do Estado Novo, continuado, mitigado, por Marcelo Caetano, sofreu o colapso, em 25 de Abril de 1974, provocado pelo Golpe de Estado do Movimento das Forças Armadas, pouco depois a transformar-se em Revolução (de que é célebre o “Verão Quente de 75”). Nesta altura, de forte convulsão política e social, a Independência portuguesa esteve de novo ameaçada. Perante a agitação provocada pelas ideias e acções revolucionárias dos movimentos vários de Esquerda, os Estados Unidos da América e a própria Espanha não deixaram de admitir a hipótese de uma intervenção de força no nosso território. Foram as acções desencadeadas no “25 de Novembro”, em que o Norte do País representou papel relevante, que corrigiram o rumo da nossa História.

No fim de todo o seu percurso através dos tempos, e trinta e sete anos depois da maviosa “canção da Gaivota”, neste ano da graça de 2011, Portugal está reduzido ao seu torrão metropolitano e aos arquipélagos dos Açores e da Madeira... Tudo o mais se foi! Mas está, neste resto, consolidada a sua Independência?

Fazemos parte de uma comunidade política que se materializa na União Europeia. Obedecemos a leis e paradigmas que nos são impostos por outros poderes. Deixámos de ter moeda própria; andámos a gastar dinheiro que não era nosso, e continuamos a fazê-lo. Percorremos anos e anos à procura de um objectivo Nacional, e ainda não o encontrámos, porque perdemos as referências históricas que nos apegavam à vida. E agora, vieram uns senhores de fora, a que chamam “Troika”, a dizer como é que nos temos de governar... Mandam tirar do nosso bolso proventos para os quais trabalhámos uma vida inteira com suor e sangue... E pouca treta!!!

Onde pára, agora, a Independência de Portugal?!...

Quem são os novos Miguéis de Vasconcelos?!...

Para que da Memória se faça História

A caça aos búfalos...

Hoje, há uma grande propensão intencional em falar da nossa “guerra de África”, explorando apenas os seus lados negativos.

Bem sabemos que a Guerra, qualquer guerra, como dizia Vieira, - É ... aquele monstro que se sustenta das fazendas, do sangue, das vidas, e quanto mais come e consome, tanto menos se farta”...

Mas quando falamos do esforço pelas armas que Portugal suportou no Ultramar Português, de 1961 a 1974, não é para fazer a apologia da guerra em si, ou seja, da guerra pela guerra, mas para caracterizar o fenómeno humano vivido por tanta da nossa juventude em circunstâncias de particular sacrifício e de doação por ideais alimentados por uma cultura sócio-histórica onde radicam os valores que definem o conceito de Pátria.

E é sob este prisma que apreciamos este período muito particular da nossa história recente, de que as gerações mais novas apenas ouvem falar de modo enviesado, com conhecimento, só, do que “interessa” contar de modo ponderado pela ideologia do narrador. Pena é que, ainda hoje, não se possa falar verdade e sem paixão sobre este período tão importante que se viveu, e que, o que nos vai chegando por várias fontes – muitas! –, traga geralmente a marca de ideologias politicas ainda remanescentes, ou visem apenas o sensacionalismo e, com ele, o lucro editorial dos relatos.

Ora, atentemos neste testemunho, que respigámos de uma citação do insuspeito Alm. Rosa Coutinho, em artigo do Coronel Ref Manuel Bernardo:

(…) Quando a guerra colonial começou em Angola, com os massacres da UPA, em Março de 1961, se Salazar tivesse feito um referendo nacional sobre a questão de mandar tropas para lá, teria conseguido o apoio popular. (…) Cfr Alm. Rosa Coutinho, em 1994, in “Memórias da Rev.” , 2004.

É assim: uma coisa são os factos reais, outra o que se pensa, a posteriori, como deviam ser.

Uma coisa é a guerra e as suas motivações, justas ou injustas, outra é o seu decurso – o palco da luta, ou seja, o “teatro da guerra”, o seu desenrolar, independentemente do resultado final. E é aqui que surgem os actores, com feitos e com defeitos.

Os militares portugueses nas antigas províncias ultramarinas cumpriram, a mal ou a bem, uma missão de Estado, de soberania, patriótica. O período passado em África, geralmente garantindo a segurança de uma zona de acção em sistema de quadrícula, teve momentos bons e momentos maus, e uns e outros se recordam hoje, muitas vezes com saudade, ou dor. É um destes episódios que hoje aqui fica para a memória.

Estávamos aquartelados, em Moçambique, no distrito de Manica e Sofala, numa posição junto do rio Zambeze. Era uma zona sem problemas de guerrilha, na altura, e a nossa missão resumia-se a patrulhamentos de vigilância e apoio das populações. Era também uma região de muita caça, embora a Venatória já aí exercesse autoridade repressiva. A caça grossa, para reforço da alimentação da tropa, fazia-se de quando em vez, com as devidas precauções e regras, quase sempre de noite, com ajuda de farolim de cabeça.

Em certa ocasião, saímos com algumas viaturas, já noite adiantada, a ver o que dava... Eis senão quando se depara à nossa frente, em pleno mato, uma grande quantidade de luzeiros brilhantes, à medida que os focos de cabeça varriam a escuridão circundante. Todos gritaram: - São búfalos! E quem foi capaz de segurar aquela malta que constituía a “força” em presença?... Rompeu um ruidoso tiroteio. Os búfalos debandaram em tropel. Um deles ficou, atingido mortalmente. Que grande bicho!...

Seguiram-se as operações de recolha, com auxílio do guincho de uma berliet, passado o cabo respectivo por cima dum forte ramo de árvore vizinha, e carregou-se o produto da caçada.

A madrugada percorria o seu curso em direcção à alvorada, que já estava próxima.

Chegámos, de regresso, ao aquartelamento pelas 4 horas da manhã, já o dia despontava no horizonte. Logo cedo, o magarefe da Companhia, procedeu ao desmantelamento da peça, e o pessoal teve carne para tirar a barriga de misérias durante alguns dias.

E por um certo tempo se manteve a cabeça do cornudo, sobre um bidão, à entrada do quartel, em jeito de sentinela, como que a perguntar... – Quem vem lá?!...