sexta-feira, 13 de julho de 2007

Um Estado sem Alma

«... Sobretudo, o Estado não é capaz de trazer o que muitas vezes é essencial: o apoio humano, o conforto afectivo, a esperança». (António Barreto, in Público)

Poderíamos concluir, com o conhecido sociólogo, que o Estado (especialmente o Estado que temos, nós) é desumano, emocionalmente frio, dando lugar à desesperança dos seus cidadãos. E um estado desumanizado é um Estado sem alma.

O Estado é a colectividade civil organizada dos cidadãos de um país, fixa num território, com repercussões para uma comunidade humana mais alargada, identificada com esse território, mas também com a sua história, a sua língua, as suas tradições, o seu património cultural, e, até, a sua religião...

O Estado é uma emanação, natural, da sociedade, e surgiu quando os grupos humanos «entenderam» ser necessário «haver alguém» que os governasse, que olhasse pela disciplina e justiça das suas mútuas relações, que pugnasse pelo bem de todos e prosseguisse os anseios e objectivos comuns, e a defesa de suas pessoas e bens. Surgiram as lideranças pessoais, o poder dos mais capazes, desde a família, passando pelo clã e pela tribo, até aos feudos e condados, às cidades-estado e aos estados contemporâneos. O chefe, o patriarca, o suserano, o monarca... instituíam o poder pronto a dirimir, a resolver todos os conflitos, impondo regras e penalizações, cobrando a contrapartida dos impostos, muitas vezes em regime discricionário e absoluto. Hoje temos ainda, nesta aldeia global em que se tornou o mundo, convivendo lado a lado, o poder absoluto e as democracias modernas, mas mesmo nestas não morreu de todo a «tentação totalitária» de que nos fala Jean-François Revel.

A actividade do Estado é uma actividade política. Os seus actos de gestão da coisa pública, além de uma vertente administrativa, assumem um carácter... político. Política, no termo grego, significa «viver em sociedade», e G. Burdeau afirma, mesmo, que qualquer facto, acto ou situação, tem, num grupo humano, um carácter político, na medida em que traduz a existência de relações de autoridade e de obediência estabelecidas em função de um objectivo comum.

Nas democracias representativas, como a nossa, quem assume o poder de gerir o Estado são os eleitos através do voto popular nos Partidos a que pertencem. Os partidos políticos têm como militantes activos uma minoria da população, e, daqueles, é elevado à Governação do Estado o chefe do partido mais votado. Este chama à sua equipa governativa as pessoas que entende, do partido ou a ele estranhos, mas, geralmente, da mesma cor ou simpatia.

Seria suposto que o elenco que toma sobre os ombros a responsabilidade do Estado, em prol do bem comum e universal, fosse o mais capaz e competente. O sistema de escolha política, porém, não o garante, antes pelo contrário, por razões várias, das quais a de que, sendo os eleitores movidos apenas pelas promessas de alguns competidores partidários, estes nem sempre cumprem o que prometeram. E, depois, uma vez alcançado o poder, a decisão... política(!), que busca legitimidade no sufrágio, tudo justifica e permite. Em cada político habita sempre um fantasma, um alter ego ditador, que tenta subverter o poder (chamado democrático) de que está investido. Se o político tem alma forte, resiste a essa tentação, e serve o povo; de contrário, ele próprio usa o poder em seu favor, desprezando o interesse público. Ser corrupto, é também servir-se do poder e não servi-lo. Os exemplos são numerosos...

Uma lei foi considerada inconstitucional pelo tribunal competente?... Se for preciso, a Assembleia (onde o Governo tem maioria parlamentar), altera a Constituição!...

Um imposto automóvel foi considerado exagerado pela C.E., devendo os lesados ser ressarcidos?... O Governo recorre!...

Juntas médicas obrigaram a que doentes graves voltassem ao trabalho... e morreram?... O Governo, altera a lei, para que novos casos não se repitam!... Só!?... E a culpa do Estado, que a isto deu azo?!...

Anselmo Borges, padre e professor de filosofia, citando António Barreto, escreveu, no Diário de Notícias, num artigo intitulado «Abortamento e Taxas Moderadoras»:

«Começa a instalar-se o medo. Como escreveu António Barreto, há "tentativa visível e crescente de o Governo tomar conta, orientar e vigiar. Quer saber tudo sobre todos. Quer controlar." Já não pode haver um desabafo, parece estimular-se a delação, pretende-se um ficheiro dos funcionários públicos onde constem inclusivamente pormenores da vida privada dos filhos, intenta-se um processo contra o bloguista que levantou dúvidas quanto à carreira académica de um político...

E sobre a «febre» abortista que se propaga em alguns hospitais e maternidades do País, pergunta ainda, no mesmo artigo, Anselmo Borges: «... quando se lê (a portaria que regulamenta a nova lei), pergunta-se o que leva o Estado, que deve proteger a vida, a ter receio de dar directamente mais informação à mulher que quer abortar? Porquê tanto receio no aconselhamento? »...

Os bispos portugueses estão apreensivos, com várias matérias que afectam a Igreja em Portugal e os portugueses, nomeadamente as relacionadas com a Concordata e com a nova legislação sobre a Comunicação Social. Foram, finalmente, recebidos pelo Governo... Que resultados concretos que se vejam?!...

Oram bem!

Duvidamos se a nossa Democracia leva à governação do Estado os mais capazes. Ser capaz para governar uma Nação é, mesmo sendo agnóstico ou ateu, ter a competência científica, técnica, ética e moral para o desempenho das tarefas que lhe são exigidas. Mais: no mínimo, é necessário que o governante seja «Homem», integro, e tenha o bom senso de pensar que os governados também o são. E ser homem integro não é tomar como referência - como o assume o materialismo marxista - que o homem não passa de oitenta quilos de matéria – uma coisa. Para a maioria dos portugueses, o homem, cada português, com fé ou sem fé em Deus, é um ser que pensa, que comunica, que inventa, que cria, que ama, que ri, mas também que se compadece e chora - é um ser com Alma.

Pode um governante não acreditar que tem uma alma imortal que o faz vivente. Mas não lhe é lícito olhar os seus concidadãos pela mesma crença, ou descrença. A pior coisa que pode acontecer a um povo é ser governado por homens «sem alma», e que a negam, também, aos governados... É por isso que ao Governo, e a todos os «administradores» deste País, em qualquer patamar da política do Estado, fica o convite do Professor Fernando Carvalho Rodrigues:

«Convoquem a alma!» (public. Europa-América)...

É que um Estado sem alma, é um Estado sem humanidade, sem amor, sem esperança. E isso é, já, um estado de... Inferno.

Pobre do meu País!... O que foste, o que és... E o que virás a ser?

3 comentários:

Anónimo disse...

a alma tb faltou, muitas vezes, nos tempos passados o que, é claro, não legitima a sua falta nos tempos presentes!
Nem tudo mau agora,nem tudo bom antigamente!
Já João XXIII falava q devemos evitar os profetas da desgraça.Sim,em nome das gerações futuras sempre devemos ser apóstolos da Esperança,pq acreditamos q Cristo é vencedor!


Abraços fraternos

Ana Loura disse...

Bom, bom seria um novo dilúvio... "Ah homens de pouca Fé..."

Quanto ao passado onde estará a alma de um patrão que nega o direito a um filho de um "seu" trabalhador frequentar o mesmo café/bar? Que alma teria um governante que não reconhecia o direito a um governado de ter opiniões diversas da sua? Que alma teria uma nação/governo que enlatava os seus filhos em navios e os fazia matar irmãos em Cristo em nome de uma soberania discutível...e por aí adiante...

Olhemos em frente com Fé e esperança no ser humano e o futuro será o que nós quisermos, dependendo da nossa militância social, política e religiosa

Abraços fraternos

Víctor Sierra disse...

Os males do passado não justificam os males do presente. Nem a eventual falta de alma na história que passou pode legitimar o laicismo grassante e militante da hora que vivemos. Hoje como ontem, o que importa é lutar para que o Evangelho se cumpra, sim, sem perder a Esperança de um futuro mais justo e mais fraterno. Quanto ao enlatar os filhos em navios para matar irmãos em Cristo, a minha visão da história é diferente, com todos os claros-escuros que ela tem. Tenho experiência bastante para disso poder falar, mas não é este o espaço nem o momento. Nem pretendo julgar aqueles que pugnando, pela entendida Liberdade, abandonaram povos inteiros no inferno de guerras fratricidas, como agora, talvez, legitimem que hospitais e maternidades acolham valências de «matadouro» de seres humanos a quem a mãe nega o direito de nascer.