quarta-feira, 2 de dezembro de 2009
Para que da Memória se faça História
terça-feira, 3 de novembro de 2009
Para que da Memória se faça História
Apontamentos de um soldado em África - 15Novas terras, novas gentes O soldado em Angola quase se assemelha ao cigano, que, nunca estando bem numa terra só, procura continuamente novas paragens, em cumprimento do nomadismo que lhe está no sangue. Obedecendo a ordens superiores, eis que, também, não podemos nós ganhar raízes num único torrão, pois é mister que novos horizontes busquemos, a fim de que nos seja dado um relativo e legítimo bem-estar, após tempos passados em sacrifício, ou, saindo de uma zona mais ou menos calma, atendamos ao chamamento de outras onde se reclamem novas forças e frescos ânimos. Isto permite ao soldado melhor conhecer esta Angola que o chamou e mais aprenda da maneira de ser da sua gente, que, de região para região, tão manifestas diferenças apresenta. Ficaram para trás essas matas tão frondosas como cheias de perigo, onde sangue dos nossos foi vertido, a selar para sempre a portugalidade destas terras; ficaram os penhascos agressivos e as picadas poeirentas e traiçoeiras; ficaram as emboscadas assassinas de uma guerrilha alimentada pelo ódio e pela subversão internacional comunista. Nova terra, agora, nos acolhe, mais atraente e mais calma, bafejando-nos com a brisa do oceano, no cair das tardes quentes e multicoloridas deste céu africano. Novas terras... novas gentes! Novas gentes… novos problemas! Enquanto que, antes, ocupávamos uma região praticamente abandonada, esta apresenta uma população mais ou menos numerosa, com brancos, mestiços e pretos. O habitat do aborígene, aqui, não se diferencia muito do tradicional. A sanzala situa-se na periferia da vila, ou junto ao mar. Não tendo a mata para se dedicar ao café e à caça, os homens ocupam-se da pesca e no trabalho das salinas. As mulheres, contudo, continuam a tratar das lavras (hortas), onde homem não mete mão; elas encarregam-se da agricultura, para cujo trabalho não causa impedimento o filho que trazem às costas ou que, enchendo-se de terra, brinca a seu lado. E é de certo modo consolador ver esses bocados de solo arenoso começarem a verdejar poucos dias após a sementeira, como retalhos pluriformes na extensa zona plana junto à praia. Deitaram à terra milho e jinguba (amendoim), utilizando ainda processos rudimentares, primitivos, mas as sementes hão-de germinar e contribuir grandemente para as suas subsistências. O problema pastoral é de acuidade extrema. Grande parte da população nativa não é baptizada, embora se verifique, neste campo, uma tendência bastante acentuada e positiva por parte dos naturais. Mas não é fácil, como à primeira vista pode parecer, aproveitar esse movimento em procura da pia baptismal. Impunha-se organizar o catecumenato, cuidar mais da seara; contudo, o trabalho é sobremaneira pesado para o pároco local, cuja função é desempenhada em acumulação pelo capelão militar, que além das suas ovelhas paroquiais tem a tropa, espalhada por várias locais distantes, e que de modo algum poderá abandonar. Alguns problemas de ordem moral, e de certo modo graves, se levantam também entre a juventude indígena, particularmente nas raparigas. A não ser a catequese, e, a este tempo, em precárias circunstâncias, nenhum movimento de apostolado existe na comunidade. E à juventude, a não ser a Igreja, mais ninguém pode aqui ensinar um caminho de plena realização de vida. A gente africana - já o disse nestas crónicas - tem pouca experiência dos padrões da nossa civilização, e, por outro lado, possui sentimentos delicadíssimos. O contacto com o europeu, quando este tem mais defeitos do que qualidades a pesar no prato da balança, pode ser-lhe, e é geralmente, prejudicial. Pode destruir-se o seu sistema tradicional de vida, sem integração natural num outro que supere o antigo. A facilidade com que, por isso, o indígena é influenciável pode permitir o caos moral... e é muito triste quando isso acontece! O terrorismo, com o abandono de algumas fazendas e a consequente delimitação das áreas de livre circulação, trouxe algumas dificuldades em matéria de alimentação. Tal ferrete deixou também as suas marcas no quadro humano desta região, facto de que as crianças são a sua mais viva e negativa expressão. Não fique o leitor desta crónica, e por ela, com ideias aterradoras sobre o que nos cerca. Não! Situações destas encontram-se em todo a mundo, e seria criminoso escondê-las. Importa encará-las de frente e combater os males pondo os problemas em equação... Mas estas equações sociais não se podem submeter unicamente aos números da Estatística; a incógnita continuará persistente, se a caridade de cada um nós, em todos os prismas porque pode ser vista, não for uma realidade activa. Tal como noutros sítios já, vi o preto pedir trabalho e executá-lo como o branco, ou melhor. Daqui se prova, ao contrário do que muitos pretendem fazer crer, que o africano não é um preguiçoso por natureza. Ele trabalha, se as suas necessidades lho determinarem, e com ele podemos contar para a restauração da terra que ele e nós amamos, irmanados num mesmo ideal cristão o patriótico. Eis que encontramos, por conseguinte, um novo campo de luta. Luta que já não é propriamente de armas, mas de corações e de almas. Que Deus nos ajude a cumprir a nossa missão durante estes meses que aqui estivermos: a trabalhar, se necessário mesmo para além das nossas forças. Ambriz - Angola Junho de 1964
Para que da Memória se faça História
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terça-feira, 21 de julho de 2009
Para que da Memória se faça História

sábado, 18 de julho de 2009
Para que da Memória se faça História
Apontamentos de um soldado em África - 11
Aos jovens
Chegou o princípio de outro mês... É altura de mandar para “Missões e Missionários” mais um destes apontamentos singelos que me comprometi a enviar para que fosse sempre mantido o contacto do nosso espírito – daqueles que se viram transportados para novas paragens, atrás de um chamamento aflito da sua amada Pátria.
Passeando, pensava, há bocadinho, na matéria que, desta vez, poderia constituir a nossa conversa. Tanto há que se podia trazer para aqui!... Horas boas... e horas más. Alegrias e dores; esperanças e desilusões; glórias... e tragédias! A guerra tem de tudo... É como um teatro imenso, onde o mundo representa ao vivo as suas peças mais variadas.
Pensava... E, não sei porquê, veio-me à mente aquela juventude que se prepara para vir até cá, a continuar a obra que outros começaram há centenas de anos; a consolidar mais e mais o sagrado nome de Portugal.
Pensei na juventude... e senti um calafrio de tristeza!... É que, na minha consciência, ao lado daquelas almas irrepreensíveis; daqueles caracteres lusitanos prontos a honrarem os seus maiores e a defenderem os lares dos seus semelhantes; daqueles corações caridosos, seguidores de Cristo, ansiosos de realizarem em toda a plenitude a vocação da terra que os tomou por filhos... apresentou-se-me essa juventude que, pejorativamente, chamam de «juventude moderna»... Esses rapazes (e raparigas) que precocemente se desligam da autoridade paterna... Esses jovens que se habituaram a olhar o mundo só pelo prisma do presente e a vê-lo segundo as suas leviandades! Muitos virão às terras de África, porque a Pátria o vai ordenar... Porque lhes vai exigir a sua parte na construção desta obra que os anteriores nos legaram e que temos de deixar incólume e mais desenvolvida aos vindouros. E estarão eles à altura de cumprir?...
Não há muito, disse o Professor Adriano Moreira:
« ... do que não podemos ser perdoados, é de que a juventude que foi confiada à escola não esteja preparada para aceitar com dignidade, com coragem e com portuguesismo os desafios que o destino reservar à Nação Portuguesa».
E a preparação da juventude, para ser genuinamente portuguesa, não pode deixar de ser profundamente cristã. A acção de Portugal no mundo é uma acção missionária. Só consolidaremos o Portugal multirracial, se nos alicerces conservarmos as pedras basilares dos princípios cristãos. De resto, não estamos nós a ser campo de luta entre forças adversas, porque queremos continuar fiéis ao Portugal de Henrique e de Nun'Álvares?...
Senti tristeza ...
Porque vi alguns jovens iludidos e levianos malbaratarem essas energias que a Pátria lhes vai pedir... Porque vi uns tantos rirem-se de Cristo e de seus ministros... Porque os senti mal preparados para esta obra tão delicada e difícil! Alguns serão, chefes, terão homens a seu cargo... e arrastarão outros atrás de si! Cegos a guiarem outros cegos!...
Compete à escola, sim, formar a juventude que vem ao Ultramar. Mas pede-se urgentemente e com gravidade à Família que eduque e vigie os seus filhos, aqueles a quem a Nação há-de ser entregue nos tempos próximos. Seria para nós um grande desastre, se a juventude que embarca para África fosse aquela que desgastou o corpo e a alma pelos salões de baile, nos macabros «twists»; aquela que passou as horas livres extasiando-se perante artes imorais e lascivas; aquela que se habituou a postergar a honra e o valor supremo dos que já caíram na luta!
Admiro neste momento um quadro real de impressionante beleza e simbolismo: através da janela, veja projectada no céu azul a gloriosa Bandeira das quinas. Ao longe, por detrás dos montes Vucussos, inóspitos e escalvados, a imensa e perigosa mata Sanga espreita com a morte escondida na sua vegetação frondosa, mas traiçoeira. Há lá famílias subjugadas que temem a tropa, sob a pressão do terrorismo cruel dos bandoleiros, vivendo assim num dilema sufocante. É preciso ir buscá-las e mostrar-lhes a verdade... Mas a Verdade que o Senhor, há muitos anos, proclamou na Palestina, e que Portugal aceitou como obrigação de levar às almas que a História lhe confiou.
A Bandeira, flutuando ao vento e projectando-se no horizonte sinistro, parece querer dizer que Portugal vencerá, por fim. Mas, nunca vencerá, se o braço do soldado já vier cansado... Se a sua alma já vier empedernida pelo pecado... Se o seu coração já vier mergulhado no veneno que tem derrubado o mundo!
Angola – Fevereiro, 1964
quinta-feira, 30 de abril de 2009
Para que da Memória se faça História

Para que da Memória se faça História
Contemplo aquele pequenito ali a brincar... Traquina, de sorriso franco, aberto... Parece que vai a cair em desequilíbrio na magreza das suas pernitas negras, mas, saltitando, consegue suster-se... Quando veio, gritava aterrado de medo, ao ser observado pelo médico. Parecia um bicho-do-mato... O mesmo acontecia às outras duas criancitas, mais ou menos da mesma idade, que esta família trouxe. Mas, agora, a sua memória esqueceu os conflitos emocionais que abalaram a sua alma pura e inocente. Já não foge, aterrorizado... Antes, corre atrás de nós às gargalhadas e, por vezes, até, desata em choro por largar os soldados, quando a irmã o vem buscar para junto dos seus. Ao demorar o meu olhar sobre esta criança, desenha-se-me no espírito uma interrogação inquietante... Interrogação que transponho para além do tempo, como que auscultando na penumbra do futuro terríveis dramas pessoais, silenciosos, mas cruéis. O mundo soube das tragédias que o terrorismo espalhou pelo norte de Angola... Soube e sentiu o abalo forte causado por tão macabros acontecimentos. A rápida decisão do Governo em utilizar prontamente as Forças Armadas obstou a que as consequências fossem ainda mais desastrosas. O cair da noite trazia para Luanda horas de amargura e desassossego. Nos musseques, a população pervertida batia com paus e soltava clamores ameaçadores, prenunciando uma arremetida ao centro da cidade. Alguns civis saíram para a rua, de armas na mão, mas insuficientes para barrar uma avalanche da multidão endemoninhada. As forças da ordem chegaram ainda a tempo, e pouco a pouco se foram recuperando as terras calcinadas pelo calor do ódio. Quase três anos passaram... Muitos esqueceram já o barulho feito pela revolta... Esqueceram aqueles que felizmente não sofreram de perto as feridas abertas pelos golpes traiçoeiros, mas não o podem esquecer nunca aqueles que viram seus lares em derrocada e mortos os seus mais queridos parentes. Não o podem esquecer aquelas famílias que vivem ainda sob a pata do inimigo... e, por conseguinte, nunca poderão esquecer essas horas cruéis aqueles que receberam sobre os ombros a espinhosa mas nobilíssima tarefa de combater esse terrorismo que tudo destrói e torna a vida fardo impossível de suportar. Olho esta criança... e outra... e outras... e penso naquelas que não posso ver mas que notícias trazem ao meu conhecimento... e também nas outras tantas que não escapam à observação das estatísticas. Olho, e vejo o seu sorriso inocente a perder a graça, a sua face a entristecer, o seu olhar, mais penetrante, a situar-se para além do horizonte... para quando a sua inteligência, mais desenvolvida, começar a compreender a dura realidade que envolve a sua existência! “Havia algumas noites – contava-nos, outro dia, um pacato nativo - que homens vinham às casas e induziam em segredo as famílias a fugiram para a mata. Comigo, nunca falaram, porque tinham medo que eu dissesse na Administração, onde exercia a profissão de cozinheiro. Então, um dia, deu-se a «confusão»”. Os povos fugiram para as matas, a habitarem locais antigos, instigados e coagidos por elementos subversivos que obedeciam a planos cuidadosamente preparados. Aqueles que quiseram ser fiéis à sua vida ordeira sofreram as terríveis consequências da onda de crimes e destruições movimentada pelos terroristas. Na ocasião da fuga, os que não estavam em casa ficaram para trás... Muitas pessoas se desgarraram de suas famílias... Muitas crianças ficaram abandonadas! Tenho na minha frente uma edição da “Cáritas” que refere um apelo levantado pelo governador do distrito do Uíge a chamar a atenção para milhares de crianças pretas abandonadas e em perigo de perecerem. Aqui na escola há uma dezena de rapazes e duas rapariguinhas ternas e despreocupadas. Alguns destes pequenos vivem em casa de comerciantes brancos, porque não têm família. Se lhes perguntamos pelos pais... a resposta é triste, e, de olhos no chão, apenas dizem: “- Foi no capim...”. A menina mais velha, com doze anos, foi recuperada há alguns meses na mata pelas nossas tropas. Lá perdeu, ao que parece, a mãe e um irmãozinho... num drama pungente. Alguns povos se têm apresentado, noutras regiões, conseguindo quebrar os grilhões que os prendem aos malfeitores. Nesta zona em que estamos, a pressão do inimigo é forte... Os guerrilheiros, aquartelados mais no interior das matas, em pontos de difícil penetração ou nas cavernas dos penhascos mais agressivos, servem-se da gente indefesa como fonte de manutenção vital. Em sítios próprios, obrigam-nos a cultivar hortas e a proceder ao abastecimento dos bandos escondidos. Para mais facilmente os reterem, geram sobre eles um clima de duplo terror: eliminam, por um lado, aqueles que tentam regressar às suas antigas sanzalas, e, por outro, induzem-lhes a convicção de que a tropa matará todo o preto que encontrar na mata, e nesse objectivo exploram todos os motivos aproveitáveis. Deste modo, é fácil compreender porque mesmo mulheres e crianças fogem como gazelas perante a aproximação da tropa, quando esta, em qualquer batida, atinge zonas habitadas. Quando uma patrulha nossa conseguiu, há cerca de um mês, recuperar a família que agora aqui vive sem temores, com assistência, e ganhando já dinheiro por serviços prestados, uma mulher indicou a outra, do mesmo grupo, que lhes iriam cortar o pescoço... Um homem já de certa idade, o chefe da família, perguntava a medo quando lhe iam dar o tiro... Tal era, pois, o terror que amedrontava o seu espírito. Com esta gente, veio esse rapazito engraçado, que nos cativa e comove com um simples sorriso... Seu pai morreu no mato, em consequência de doenças ocasionadas pela alimentação deficiente, que mais difícil torna a vida desses povos refugiados. A mãe fugiu com outros nativos mata adentro, na altura em que as nossas forças chegavam. A memória dos seus três anitos é leve demais para reter factos tão tristes... Mas um dia, voltará ainda a sentir o drama da sua vida... como tantos outros... no silêncio da sua consciência já mais aberta à compreensão do que o rodeia! Numa noite trágica de ódios recalcados e de ambições desmedidas, desabou sobre as terras de Angola uma tempestade sangrenta de rancor e de crueldade... Mas também numa noite fria, há muitos anos, uma nova Luz rasgou a noite dos tempos, o negrume dos céus da humanidade perdida, e um clamor magnífico, suave, ecoou sobre o mundo... Era uma mensagem de Paz! Uma mensagem de Amor para todos homens!... Neste NATAL, de 1963... lembrai junto a Jesus, no Presépio, estas almas despedaçadas que sofreram, sofrem... e ainda hão-de sofrer por muitos dias e anos as consequências desse cataclismo cruento que dilacerou a nossa Pátria!... Lembrai também os soldados, que lutam nesta guerra por uma esperança de paz!... E por que havemos de esquecer, também, os próprios que nos combatem... aqueles que foram pervertidos?!... Possa a LUZ dessa noite santa inundar todos os povos, para que todas as almas encontrem esse caminho de AMOR e de VERDADE que há dois mil anos se abriu sobre Belém! Angola - Dezembro 1963
terça-feira, 21 de abril de 2009
Para que da Memória se faça História
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
Para que da Memória se faça História
terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
A Coragem de Viver
Já lá vão cerca de dois anos, vi, numa papelaria desta minha terra, exposto um livro que, pelo seu título, me chamou a atenção. Peguei nele, folheei-o, li algumas pequenas passagens, e fiquei logo impressionado pelo seu conteúdo. Adquiri-o, e li-o todo com ávido interesse.
Simplesmente impressionante! Coragem de viver!... Sem dúvida, mas também testemunho de muito amor e dedicação dos protagonistas... Familiar e profissional.
Uma menina que nasceu num parto difícil, e, por isso, ficou marcada com deficiências físicas, motoras, para toda a vida.
Uma família exemplar, com os progenitores a dedicarem-se, devotamente, a sua filha, para que ela conseguisse usufruir a melhor qualidade de vida, tanto no campo da saúde como no âmbito da sua educação e formação integral (felizmente, a criança não tinha ficado com sequelas nos seus dotes de inteligência).
Um médico, que a cerca de duas centenas de quilómetros de distância, se empenhou totalmente a multiplicar os cuidados e a dilatar a esperança de um futuro promissor para a sua paciente. Exemplo de abnegação pessoal e de muita competência profissional e humana.
Depois... O dedo do Altíssimo a desenhar o percurso de tudo isto na vida atribulada da menina! Os acontecimentos «misteriosos» de que se serviu o Espírito, para guiar por mão sobrenatural os passos desta família! O lugar privilegiado onde se acendeu um farol de esperança, que veio iluminar o caminho a percorrer (capela da Senhora da Saúde, nos Carvalhos). Nada acontece por acaso, neste mundo. O que é preciso é estarmos atentos e disponíveis, para, no momento certo, reconhecer os sinais de Deus.
Não temos qualquer intuito publicitário na divulgação desta obra. Contudo, achamos que «A Coragem de Viver» é um autêntico Evangelho de vida, uma Boa Nova de salvação para todos os que desesperam dos seus dias mais ou menos dolorosos, mas sobretudo uma voz gritante contra aqueles que propagandeiam o aborto e a eutanásia como solução para a falta de coragem para viver e abraçar o sofrimento, que polarizado na Cruz de Jesus Cristo, é caminho de redenção e de felicidade eterna.
Não se pode ler este livro, esta autobiografia, sem verter, de quando em vez, algumas lágrimas... É este, outro condão que o escrito possui – penetrar até ao íntimo mais profundo de nós mesmos e amolecer o nosso coração petrificado pelas nossas auto-suficiências, pelo nosso edonismo ávido de prazeres, pela nossa insensibilidade diante do sofrimento alheio.
Susana Santos... não é uma «deficiente»! Susana Santos é uma heróína, como heróis são os seus pais e o médico que a tem acompanhado no seu longo calvário de dor.
A Susana, uma jovem de 31 anos de idade, foi aluna da Escola Preparatória P. António Luís Moreira, e cursou a faculdade de economia da Universidade do Porto. Há dias, encontrei-a com seu pai, num supermercado desta nossa terra. Não pude resistir a manifestar-lhes a minha gratidão pelo seu testemunho de vida. E o facto de trazer hoje, a estas páginas, este apontamento, apenas se deve à vontade de lhe prestar pública homenagem, e de bradar bem alto a todos os que isto possam ler, nestes momentos de crise colectiva que atravessamos, que, apesar de tudo, a Vida tem um valor infinito que é preciso defender e preservar, e que, contra todos os seus detractores e contra os profetas da desesperança, importa nunca perder, como todas as Susanas deste Mundo, a «Coragem de Viver».
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
Para que da Memória se faça História
Para que da Memória se faça História
Apontamentos de um soldado em África 5Soldados de batina branca
Eram seis e meia da tarde, a passar, já. A noite, vencendo o receio do crepúsculo, começava a cobrir tudo em volta. A sineta daquela cruz tosca, feita de dois troncos de árvore, acabara de tocar as últimas badaladas. Ia começar a devoção do terço à Mãe Imaculada... o acto pleno de beleza e de singular conforto espiritual do Mês de Maria. No altar daquela capelinha tão simples e humilde, construída com ramos de palmeira, presidia a Rainha Santa Isabel, numa homenagem dos soldados de Coimbra. Duas Rainhas a velarem pela mesma Pátria amada!... A oração começara, cheia de entusiasmo. Aos mistérios, elevam-se maviosos cânticos, que nos fazem sentir saudade e comoção. Saudade das mesmas cerimónias da terra natal – tão distante; comoção por aquele brotar de paz e louvor em terras que o ódio dilacerou e que olhos traiçoeiros vigiam. O clamor daqueles soldados corria os ares. Talvez penetrasse por entre essas matas onde o perigo se esconde na frondosa vegetação... Talvez tocasse aqueles montes tão imponentes como inóspitos que avultam no horizonte! E se essa mensagem de amor conseguisse mover, no caminho, os corações dos que foram pervertidos... Se a solicitude da Mãe do Céu vencesse a dureza daquelas almas... Um dia, que Deus fará, elas ouvirão a Sua voz maternal... porque o Seu Coração há-de triunfar, finalmente! - Eles já estão arrependidos - dizem os nativos que aqui vivem sossegadamente.- Eles passam mal, por lá. O preto não presta... O preto, na mata, apanha doença e morre – acrescentam. E tantos foram, na ilusão maligna! De rica e densamente povoada, esta terra maravilhosa - este nosso novo poiso... - é hoje encontrada num abandono infecundo. E a devoção continuava, fremente, sincera, filial... ... Pelos soldados, que à guerra vão, Senhora, escuta nossa oração! Aproveitando o ensejo deste piedoso acto, queria hoje dedicar as minhas palavras a uma certa classe de soldados, às vezes esquecida entre os feitos barulhentos das armas bélicas. Esquecida, talvez porque as suas armas por de mais silenciosas para uma guerra de tiros, mas sumamente eficazes e oportunas para os que, mesmo nas lutas sangrentas, não deixam de sentir a necessidade de combater nas guerras da alma... De organizar a defesa contra a concupiscência feroz, contra o desespero aviltante, que nas horas de insegurança e desconforto armam perigosas ciladas ao espírito do homem. Abnegados, voluntários no sacrifício, eles, esses soldados de batina branca - os bravos capelães militares -, deixaram tudo, ao chamamento da consciência, entregando-se com toda a sua alma ao serviço da Pátria, e por ela servem às almas e a Deus. Incompreendidos, por vezes, mal queridos, em tantas outras, eles sujeitaram-se a uma vida cheia de contrariedades e privações, tocando, em algumas ocasiões, o limiar da amargura… Apenas porque ouviram o brado aflitivo de tantas almas que foram tiradas ao afago terno do lar, que deixaram de ter presente a força espiritual da sua igreja, que viram ficar para trás o seu ambiente normal entre os amigos e as coisas queridas. Deixaram tudo, porque a Nação lhes pediu: - Vinde, que de vós preciso! -; porque o Senhor lhes disse, no seu foro íntimo: - A missão é nobre... Caminhai! E ei-los por essa África escaldante a defender as almas dos heróicos militares, para que estes possam vencer as condições hostis a que o dever os trouxe, e empenhem todo o seu valor na luta contra o mal que o príncipe das trevas espalhou nesta terra de promissão... Para que eles encontrem, na hora derradeira - aqueles a quem Deus chamar no campo da honra - uma palavra de confiança, que lhes fortifique a fé, uma chama de amor que lhes traga o arrependimento submisso, e lhes abra, no perdão, as portas da Eternidade. Momentos inesquecíveis e gloriosos, esses que o padre vive - apesar de humanamente tristes - quando em seus braços entrega a alma a Deus, o soldado que perece no cumprimento do sagrado dever! Soldados de batina branca!... Podeis vê-los no altar, celebrando o Santo Sacrifício antes das lutas; ouvindo as confidências dos rapazes; perdoando as suas misérias; de fato de combate, indistinguíveis entre os mais sujos e esforçados atiradores, penetrando nas matas e no capim, abraçados pelo perigo, mas confiando na Providência, para que os últimos sacramentos não faltem ao ferido de golpe mortal, ou mesmo ao inimigo, moribundo, arrependido. Podeis vê-los, ainda, entre as populações pacíficas e laboriosas, acalentando, ensinando... missionando! Não são desconhecidas as obras de engrandecimento social que os capelães militares têm desenvolvido entre as populações nativas. Os jornais proclamam-nas sem rebuços. Há tempos, numa patrulha de reconhecimento feita a um monte próximo, o capelão acompanhou-nos. De espingarda em punho - que pedira a um soldado para esse mesmo fim - ele tomou também a dianteira, a abrir caminho por entre o capim espesso que nos passava muito acima. Subiu, e cansou-se, como nós; comeu da mesma conserva; e foi até cuspido da viatura em que seguia, quando esta, num desnível de terreno, se voltou. No fim de tudo, apenas se preocupava com a hora de regresso, porque tinha ainda o breviário para rezar!... Inúmeros são os exemplos que eles dão nesta Angola, para uma verdadeira gesta; sem conta as vezes que, plena refrega, ouviram assobiar por sobre a cabeça as balas assassinas. Bravos soldados da Paz, nesta guerra insidiosa que o mundo nos levanta traiçoeiramente! Gloriosa, a página que na História inseris! A Pátria vos agradecerá por todo o sempre, e serão fecundos os frutos que espalhais! Sempre vos ficará bem a farda do nosso valoroso Exército, e nas suas fileiras jamais destoará a alvura da vossa batina, onde se pode reflectir, sempre com fulgor, o verde rubro da nossa Bandeira! O acto piedoso ia terminar. De frente para os seus rapazes, o padre capelão incutia-lhes no espírito um novo alento, através das suas palavras cheias de caridade. Mais um dia de trabalho chegara ao fim, e eles iam recolher à caserna, em busca do merecido descanso, com a alma mais tranquila, de coração entregue a Maria, Mãe de Deus. A capelinha ficou vazia, mas naqueles montes distantes... ainda ecoavam os doces cantares do mês de Maio... ... Enquanto houver portugueses, Tu serás o seu amor... O seu amor!...
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009
Para que da Memória se faça História

Para que da Memória se faça História
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